terça-feira, 31 de outubro de 2017

A integração do negro na sociedade de classes - Florestan Fernandes


Nos anos 50, Florestan Fernandes e Roger Bastide iniciaram uma série de estudos patrocinados pela UNESCO e que tinha como objetivo verificar o suposto caráter democrático das relações raciais no Brasil.[2] Estes estudos culminaram na modificação substancial da interpretação até então vigente acerca das relações raciais no contexto da sociedade brasileira. De uma sociedade tida como racialmente resolvida passamos à constatação de que os grupos raciais se posicionam diferentemente no interior da ordem social e de que a distribuição das posições sociais está ligada ao preconceito e à discriminação racial praticada contra os negros.

De acordo com Florestan Fernandes:

(...) a sociedade brasileira largou o negro ao seu próprio destino, deitando sobre seus ombros a responsabilidade de reeducar- se e de transformar-se para corresponder aos novos padrões e ideais de homem, criados pelo advento do trabalho livre, do regime republicano e capitalista.[3]

De certa forma podemos compreender a exclusão do negro do cenário social como conseqüência direta do processo de abolição da escravidão. Em outras palavras, a inserção do negro aconteceu de forma lenta com a ocupação dos setores mais subalternos na sociedade.

A economia competitiva, como o símbolo da modernização da estrutura produtiva da sociedade brasileira, desenvolveu-se como conseqüência imediata da abolição da escravidão. Em outras palavras, o negro sofreu as conseqüências diretas de um processo marcado pelas desiguais condições de acesso às novas ocupações econômicas advindas da mercantilização da economia.

Isto acarretou, antes de tudo, a inserção desigual dos vários grupos raciais na economia competitiva, ressaltada por Fernandes como processo de racionalização econômica em curso visando a constituição de um novo modelo de organização da vida econômica e social. Nesse processo, evidentemente, ainda segundo Fernandes, a integração do negro foi retardada uma vez que o processo imigratório colocado em prática pelo governo nacional priorizou a utilização de braços europeus dentro de uma concepção, então em voga, de que os imigrantes brancos representavam o advento da civilização e da modernização da sociedade nacional. 

Assim, tomemos a afirmação de Fernandes:

O estrangeiro aparecia,(...), como a grande esperança nacional de progresso por saltos.(...). Desse ângulo, onde o “imigrante” aparecesse, eliminava fatalmente o pretendente “negro” ou “mulato” , pois entendia-se que ele era o agente natural do trabalho livre. [4]

Neste sentido, Florestan demonstra que o desenvolvimento da economia competitiva em São Paulo solapou as expectativas de negros e mulatos, uma vez que esses estratos raciais não estavam preparados dentro de um quadro de concorrência para enfrentar a adaptabilidade do trabalhador importado para aquelas tarefas condizentes com a nascente economia capitalista. Portanto as oportunidades econômicas não seriam igualmente desfrutadas pelos grupos raciais em função do ponto de partida assimétrico a que foram submetidos.

De acordo com este autor:

(...), o regime escravista não preparou o escravo ( e, portanto, também não preparou o liberto ) para agir plenamente como “trabalhador livre” ou como “empresário”. Ele preparou- o, onde o desenvolvimento econômico não deixou outra alternativa, para toda uma rede de ocupações e de serviços que eram essenciais mas não encontravam agentes brancos. Assim mesmo, onde estes agentes apareceram ( como aconteceu em São Paulo e no extremo sul ), em conseqüência da imigração, em plena escravidão os libertos foram gradualmente substituídos e eliminados pelo concorrente branco.[5]

Dessa forma, o negro foi empurrado para os setores mais subalternos no interior da sociedade, pois o trabalho livre não lhe propiciou as condições de inserção nos setores dinâmicos da economia competitiva. Por outro lado, os trabalhadores imigrantes tiveram a seu favor amplas possibilidades de ascensão social em função das condições sociais inerentes à economia de mercado nascente.

A estrutura social fundada no período pós-abolição não absorveu a mão de obra negra em função de que o agente do trabalho escravo não contava com as condições sociais adequadas a esta nova realidade. Ou seja, o negro saindo de um modo de vida escravista encontrou todas as dificuldades de adaptação à estrutura social em construção. O processo de inserção, por conseqüência, teria que ser doloroso e excludente.

De acordo com Hasenbalg:

(...) com a desagregação do regime escravista, segundo Fernandes, a mudança no status legal de negros e mulatos não se refletiu numa modificação substancial de sua posição social. À falta de preparo para o papel de trabalhadores livres e ao limitado volume de habilidades sociais adquiridas durante a escravidão acrescentou- se a exclusão das oportunidades sociais e econômicas resultantes da ordem social competitiva emergente. Os ex- escravos e homens livres de cor foram relegados a margem inferior do sistema produtivo, dentro de formas econômicas pré- capitalistas e áreas marginais da economia urbana.[6]

Evidentemente que Fernandes atribui ao modo como se organizou a produção tipicamente competitiva o papel de canalizador das tensões vividas pela não incorporação do negro ao mercado de trabalho. De certa forma, ainda segundo este autor, temos a sobrevivência de arcaísmos do passado no interior de uma ordem social competitiva. Em outras palavras, a discriminação racial e o preconceito contra os negros configuram reminiscências do passado que, paulatinamente, perderiam o poder classificatório numa economia de mercado.

Nesse sentido, enquanto um arcaísmo do passado, a discriminação racial e o preconceito constituem elementos fundantes de uma estratificação social segundo critérios bem definidos de cor da pele. Isto implica a percepção do racismo como parte de uma herança do passado que sobrevive na sociedade nacional. Paulatinamente, as transformações na economia competitiva provocarão o desaparecimento desses resquícios, uma vez que a mesma está fundada em critérios racionais de competitividade que não comportam arcaísmos de outras épocas.


Nesse sentido:

(...) o preconceito e a discriminação racial apareceram no Brasil como conseqüências inevitáveis do escravismo. A persistência do preconceito e discriminação após a destruição do escravismo não é ligada ao dinamismo social do período pós-abolição, mas é interpretada como um fenômeno de atraso cultural, devido ao ritmo desigual de mudança das várias dimensões dos sistemas econômico, social e cultural.[7]

Daí a ênfase de Fernandes no entendimento da ordem social competitiva, pois, à medida que esta se desenvolvesse, teríamos a superação desses mecanismos de discriminação racial. As desigualdades sociais seriam resolvidas à proporção que os negros fossem integrados à economia de mercado e as distinções sociais entre brancos e negros dessem lugar a uma situação de igualdade nas oportunidades de ocupação, renda e educação. Dessa maneira:

Fernandes argumenta que o modelo arcáico de relações raciais só desaparecerá quando a ordem social competitiva se libertar das distorções que resultaram da concentração racial de renda, privilégio e poder. Assim, uma democracia racial autêntica implica que negros e mulatos devam alcançar posições de classe equivalentes àquelas ocupadas por brancos.[8]

Desse modo a interpretação fornecida por Fernandes pressupõe a compreensão da ordem social capitalista expressão exata dos valores democráticos e da igualdade das oportunidades fundados no critério racional da competência. Como podemos perceber, este autor apresenta uma interpretação dinâmica da realidade brasileira e, portanto, considera a eliminação das barreiras raciais um acontecimento necessário ao pleno desenvolvimento da economia competitiva. Por isso:

(...) visto que o desenvolvimento econômico e a plena constituição da ordem social competitiva são considerados como os principais processos subjacentes à eliminação dos aspectos arcáicos das relações raciais , F. Fernandes é levado a uma visão cuidadosamente qualificada, porém otimista, sobre o futuro das relações raciais brasileiras.[9]

Esta teoria nos leva a explicar o racismo, no contexto da sociedade de classes, como algo que tem sua raiz no passado. Na economia competitiva sobrevivem elementos da organização social anterior os quais constituem anomalias que o desenvolvimento posterior da economia de mercado tratará de corrigir, tornando o processo de ascensão-integração do negro possível nos quadros da ordem social capitalista. Nessa perspectiva:

(...) após a abolição do escravismo, argumenta Fernandes, a sociedade herdou do antigo regime um sistema de estratificação racial e subordinação do negro. A persistência desta estratificação após a emancipação é devidamente atribuída aos efeitos do preconceito e discriminação raciais. Apesar da compreensiva e meticulosa dissecação [análise] das relações raciais brasileiras, a principal debilidade interpretativa resulta dessa conceituação do preconceito e discriminação raciais como sobrevivências do antigo regime. Essa perspectiva, relacionada à teoria de caráter assincrônico da mudança social, explica os arranjos sociais do presente como resultado de “arcaísmos” do passado. Assim, o conteúdo “tradicional” ou “arcáico” das relações raciais, revelado pela presença de preconceito e discriminação raciais, é considerado como um remanescente do passado. O modelo tradicional e assimétrico de relações raciais, perpetuado pelo preconceito e pela discriminação, é considerado uma anomalia da ordem social competitiva. Em conseqüência, o desenvolvimento ulterior da sociedade de classes levará ao desaparecimento do preconceito e discriminação raciais. A raça perderá sua eficácia como critério de seleção social e os não-brancos serão incorporados às posições “típicas” da estrutura de classes. [10]

Notadamente, Fernandes elabora uma interpretação das relações raciais brasileiras em termos da desagregação da estrutura social anterior o que implica a compreensão do contexto das relações raciais contemporâneas como o resultado imediato da conjugação de forças sociais presentes na batalha da abolição. Porém outro aspecto nitidamente perceptível é o fato deste autor associar a economia competitiva à posterior eliminação da discriminação e do preconceito racial dando vazão à compreensão de que a expansão capitalista possibilitaria a adequação das relações raciais à estrutura de classes da sociedade brasileira. (Confira um papo sobre a condição social do negro - CLICANDO AQUI)

As desigualdades raciais estariam, desse modo, condicionadas pela sobrevivência de resquícios da sociedade escravista na realidade sócio-econômica nacional. Assim Fernandes apresenta uma perspectiva otimista quanto à inserção dos negros na estrutura de classes da economia competitiva. Isto equivaleria a dizer que as relações raciais pautadas pela subordinação do negro, paulatinamente, seriam superadas enquanto se ampliasse o espectro da economia capitalista. Segundo Arruda:

(...) no quadro dessas considerações, explicitam- se concepções do autor: a noção de ordem social competitiva, ou sociedade capitalista, enquanto forma de estratificação aberta e tendencialmente democrática; a identificação do mito à ideologia, numa acepção mais restrita a esse fenômeno de natureza simbólica. Nesse sentido, Florestan trabalha com a noção de mito no sentido diverso da tradição antropológica, ou seja, enquanto universo de representações exclusivas. De outro lado, a discussão do mito da democracia racial permite- lhe ultrapassar certas visões dominantes e “representa uma recusa à visão conservadora que marca o debate não somente sobre a questão racial, mas também na Sociologia no Brasil” (Bastos, 1987: 141. Citado pela autora.). No interior desses parâmetros analíticos, o sociólogo desenvolve a segunda parte de sua reflexão, quando a ordem social competitiva expande- se no sentido capitalista no momento da Segunda Revolução Industrial, o que possibilita o reequacionamento das formas de integração do negro.[11]

Certamente o trabalho que investiga as relações raciais levado a cabo por Fernandes constata a existência do fenômeno das desigualdades de oportunidades entre brancos e negros. No entanto a preocupação investigativa deste autor o leva à percepção da solução nos termos de um reordenamento das relações sociais, econômicas e políticas no interior da economia competitiva.
Em suma, este autor demonstra o caráter desigual das relações entre brancos e negros e desmistifica a noção de democracia racial à medida que apresenta, em contraposição, elementos discriminatórios presentes no cotidiano das relações raciais no Brasil.[12] Porém associa estes desajustes sociais à existência de resquícios da escravidão ainda marcando a realidade brasileira.
Ainda, de acordo com Arruda:

(...) apesar da tendência à assimilação, o prestígio e o poder permanecem enleados aos princípios sociais dominantes herdados do passado e encarcerados pela ordem branca. A lentidão e descontinuidade do ritmo da integração apontam para os dilemas de uma história que não rompe as cadeias do passado. No âmbito da sociedade de classes, apesar do nuançamento da relação entre negro e condição social ínfima, os egressos da escravidão não se constituíram em ameaça às posições do branco e sequer entraram no universo das percepções deste.(...). Na impossibilidade de constituir- se, efetivamente, em sujeito da sua trajetória social, o negro vivencia uma realidade do preconceito contraditória, que pode ser tanto neutralizada, quanto acirrada, em função da tradição cultural da sociedade. Esta via de ligação entre o passado, o legado cultural da sociedade escravista e o presente sofre as injunções de circunstâncias e não foi gestada na dinâmica intrínseca à ordem social competitiva. [13]

Dessa forma, a interpretação oferecida por Fernandes aponta para o entendimento do presente- sociedade capitalista - como algo ainda incompleto - sobrevivência de aspectos do passado escravista - e, portanto, as práticas discriminatórias seriam como um corpo estranho no emaranhado de relações sociais capitalistas.



Notas:

[1] Utilizo a categoria Negro para designar pretos e pardos.
[2] Confira: SKIDMORE, T. Fato e Mito: Descobrindo um problema racial no Brasil. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, no. 79, nov., 1991. p.5-16.; TELLES, E. Contato Racial no Brasil Urbano: análise da segregação residencial nas quarenta maiores áreas urbanas do Brasil em 1980. In: LOVELL, P. A .(Org.). Desigualdade Racial no Brasil Contemporâneo. Belo Horizonte, CEDEPLAR/FACE-UFMG, 1991. P. 341-365.
[3]FERNANDES, F. A Integração do Negro na Sociedade de Classes. vol. 1 e 2. São Paulo: Àtica, 1978. p. 20.
[4] Idem. p. 27.
[5] Idem. p.51-2.
[6] HASENBALG, Carlos. Discriminação e Desigualdades Raciais no Brasil. Rio de Janeiro: Graal, 1979. p. 72.
[7] Idem. p. 73.
[8] Idem. p. 74.
[9] Idem. p. 74.
[10] Idem. p.75-6.
[11] ARRUDA, Maria Arminda do N. Dilemas do Brasil Moderno: a questão racial na obra de Florestan Fernandes. In: MAIO, Marcos C. e SANTOS, Ricardo V. (Orgs.). Raça, Ciência e Sociedade. Rio de Janeiro: FIOCRUZ/CCBB, 1996. p.198.
[12] Confira as obras de FERNANDES, F. O Negro no Mundo dos Brancos. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1972.; A Integração do Negro na Sociedade de Classes. Ob. cit.
[13] ARRUDA, Maria Arminda do N. Ob. cit. p. 199.

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Casa Grande e Senzala de Gilberto Freyre | Livro para download


No livro, Casa-Grande & Senzala, publicado em 1933, o sociólogo Gilberto Freyre discute a formação do Brasil sob o regime da economia patriarcal apontando o papel da “Casa-grande” e da “Senzala” na formação sociocultural brasileira. A obra é uma espécie de “introdução à história da sociedade patriarcal no Brasil”, fundamental para aqueles que queiram conhecer melhor a história do Brasil. Segue, abaixo o link para fazer o download da obra:




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Para conferir um papo sobre grandes pensadores brasileiros - CLIQUE AQUI







fonte: farofa filosófica

Heidegger e a questão da técnica


Heidegger é o filósofo que, em relação a Nietzsche e sua alardeada “superação da metafísica”, dá um passo aquém em relação a essa afirmação e procura fazer um cuidadoso  processamento crítico da racionalidade vigente em sua época. Para ele, o que podemos perceber, cada vez mais, é o caráter enigmático do ser humano – e o abismo que nos cerca. Nosso progresso, nosso télos, se não sofrer nenhuma espécie de desvio, será em direção ao ser-máquina. Entretanto, como seres humanos, somos entes aos quais não é permitido o próprio conhecimento – e isso pouco tem a ver com a tecnologia maquinística. Não sabemos o que é o homem, e mesmo que quiséssemos, não poderíamos descobri-lo. Para Heidegger, devemos nos contentar em saber que somos um signo indecifrável – mas poderíamos dizer, em contrapartida, que isso seria algo que nos “dá o que pensar”.  (Para conferir um papo sobre Friedrich Nietzsche - CLIQUE AQUI)

Em seu manuscrito Der Anklang, Heidegger afirma que o fato de as descobertas técnicas terem sido usadas tanto para a construção quanto para a destruição, criou a aparência segundo a qual a técnica estaria acima desse maniqueísmo entre bem e mal. Difundiu-se a ideia de que a técnica seria neutra, e seria o homem quem a converteria em maldição ou benção. Mas, segundo coloca Heidegger, o que é o homem e o que é a técnica? Afinal de contas, não seríamos nada além da produção técnica do que somos e do que não somos em nós mesmos? Ademais, a aparente neutralidade da técnica poderia servir como um incentivo para que o ser humano busque conquistar tecnicamente a natureza e organizar tecnicamente a história – para, dessa forma, criar uma instituição mundial que, fabricada pelo homem, assuma a prosperidade e o bem-estar de si próprio.  

Há algum tempo, a técnica, encarnada tanto no homem quanto na máquina, é o signo atual de nossa relação com o mundo e o modo como a sociedade contemporânea se articula. Nossa pretensão, ao longo da história, foi ver a técnica como fornecedora de bens e de serviços cada vez melhores e mais avançados, para aliviar o fardo de nossa existência, reduzir nosso sofrimento, aumentar nosso bem-estar e expandir os horizontes da vida humana. Heidegger acha que estamos próximos de nos apoderarmos da totalidade da Terra e sua atmosfera, e de obtermos assim, sob a forma de forças, o que está escondido no reino da natureza, submetendo o curso da história à planificação e à ordem de um governo terrestre.   

A principal questão que preocupava Heidegger era a questão do ser e seu destino no Ocidente. Tudo se resumiria ao ser. Para ele, somente o homem, chamado pela voz do ser, vivencia a mais sublime das experiências – ele é o ente que é. Heidegger nos ajuda a esclarecer com o que estamos comprometidos na era da técnica maquinística e os desafios que devemos enfrentar e vencer, se quisermos estabelecer uma nova relação com esse fenômeno.



fonte: puc edu

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

O conceito de Cibercultura em Pierre Lévy


A proposta de Lévy é pensar a cibercultura, não de forma a fazer uma critica por seus impactos, e nem com o otimismo de que essa seria a solução para todos os problemas do mundo. A cibercultura é um termo conceituado pelo autor, como o "conjunto de técnicas, de práticas, de atividades, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço".

Há de se compreender e reconhecer que o crescimento do ciberespaço foi o resultado de um movimento internacional de jovens em busca de experimentar outras formas de comunicação, diferentes daquelas a nós propostas pela mídia clássica. De fato estamos vivendo a abertura de um novo espaço de comunicação, cabendo apenas a nós explorar as potencialidades positivas oferecidas em um plano econômico, político, cultural e humano.

O autor propõe que nos mantenhamos receptivos em relação às novidades da comunicação, e tentemos compreende-las, mesmo sabendo que nem tudo o que se faz na nova rede digital é bom, a questão não é essa, mas sim, reconhecer as mudanças que resultam das novas redes de comunicação para a vida social e cultural.

Na introdução, Lévy usa o termo dilúvio para fazer uma metáfora da propagação desenfreada dos meios de comunicação, um dilúvio informacional que nunca cessará. A obra é composta por 18 capítulos divididos em três partes. Na primeira delas, intitulada de Definições, Lévy apresenta idéias sobre os impactos culturais e sociais das novas tecnologias, fazendo uma descrição de alguns dos conceitos que fazem parte e sustentam a cibercultura. Analisando o desenvolvimento das técnicas e seus impactos nas sociedades, a participação do ser humano na cibercultura torna-se uma necessidade. Outro ponto levantado por Lévy trata das variadas formas da interatividade na comunicação em relação à mensagem, abordando o ciberespaço.

A segunda parte do livro, intitulada de Proposições, enfoca as implicações culturais decorrentes do desenvolvimento do ciberespaço, resgatando novas formas das evoluções técnicas da civilização emergente, fazendo também uma análise das novas práticas das comunicações possibilitadas pelo ciberespaço, compreendendo o movimento social que propaga a cibercultura por sua universalidade. Lévy levanta o questionamento de como o desenvolvimento do ciberespaço afeta o espaço urbano e suas organizações, faz uma analogia entre comunidades virtuais e comunidades territoriais; questiona a substituição das funções da cidade clássica pelos serviços e recursos técnicos do ciberespaço e a exploração dos diferentes tipos de articulação entre o funcionamento urbano e as novas formas de inteligência coletiva que ali se desenvolvem.

A terceira parte do livro, intitulada de Problemas, trata das questões negativas, das criticas e conflitos causados pela cibercultura. O autor lembra que o ciberespaço também pode ser colocado à serviço do desenvolvimento individual e regional, apresenta as perguntas mais freqüentes, possibilitando uma reflexão sobre o tema. Lévy enfoca que a cibercultura redefine o conceito de cultura, inventando uma nova “forma de fazer advir a presença virtual do humano frente a si mesmo que não pela imposição da unidade de sentido”.

Em geral, Lévy propõe uma reflexão aprofundada das mudanças culturais que ocorrem a partir da familiarização e do uso das novas formas de comunicações e da informática e seus impactos nas sociedades atuais. 



fonte: unijui

Noam Chomsky | 8 livros para download


Noam Chomsky tornou-se um autor fundamental no que se refere à linguística moderna, é autor de importantes trabalhos sobre as propriedades matemáticas das linguagens formais, tendo seu nome associado à chamada Hierarquia de Chomsky. Seus trabalhos, combinando uma abordagem matemática dos fenômenos da linguagem com uma crítica do behaviorismo, nos quais a linguagem é conceitualizada como uma propriedade inata do cérebro/mente humanos, contribuem para a discussão da psicologia cognitiva, no domínio das ciências humanas. (Confira também um papo sobre "Amor Líquido", de Zygmunt Bauman - CLICANDO AQUI)

Segue abaixo a lista de obras autor disponíveis em PDF e, mais abaixo, em vermelho, o link para realizar o download dos livros:

As ideias de Chomsky | Autogestão hoje | Linguagem e mente | Mídia | O Lucro ou as Pessoas | O que realmente o Tio Sam quer | Os caminhos do poder | Reflexões sobre a linguagem

Para fazer o download das obras - CLIQUE AQUI


fonte: farofa filosófica

domingo, 22 de outubro de 2017

Norbert Elias e O Processo Civilizador


O ponto de partida do livro é entender as diferenças dos conceitos de civilização e cultura. Os dois não são universais e não são atemporais. Ambos os conceitos lidam com as realizações da sociedade, com a sua organização política, com sua estrutura econômica, com suas tecnologias e etc, mas há dois movimentos notáveis e contrários: cultura se refere a um plano intelectual, abstrato, enquanto civilização está ligada a um plano mais prático e concreto. Cultura, também, se refere à especificidade (a cultura de um povo ou de uma sociedade é uma cultura única e específica), já civilização se refere a um princípio de universalização, civilização é aquilo que todas as sociedades alcançariam num dado momento, é um movimento da “Humanidade”. Civilização é algo em comum a todas as sociedade – é o potencial dessas sociedades.

Estes conceitos, por mais difícil que seja imaginar, tiveram um momento de nascimento que localizou socialmente seus usos. Basicamente, essa sociogênese dos conceitos começa com a análise de Elias da burguesia alemã.

Civilização e Cultura

A época analisada é a da aristocracia de corte. Neste período, a burguesia alemã detinha força política, não conseguia cargos relevantes na administração do Estado e também não tinha acesso à sociedade de corte. (CONFIRA UM PAPO SOBRE CULTURA - CLICANDO AQUI

A sociedade de corte era composta por aqueles que participavam das rotinas da corte, assim como participam de seus eventos e se submetiam às suas regras. O que Elias análise com um enfoque poderoso são os “modos”. A etiqueta da corte. Os comportamentos e as relações que sua vigência têm.

A aristocracia alemã rejeitava a sua própria língua. A língua refinada era o francês e as cortes utilizam esta língua. Há um aspecto duplo: evitar as classes dominadas e estabelecer um princípio de distinção. A burguesia alemã, por sua vez, tentava aprender o idioma francês, na esperança de ter algum reconhecimento e conseguir alcançar posições mais privilegiadas na estrutura social. Entretanto, com todas as limitações que recaiam sobre esta classe, a única brecha encontrada foi a intelectual.

A burguesia alemã rejeitava a aristocracia de corte, rejeitava seus comportamentos “refinados”, mas sempre superficiais, não conseguia posições importantes na organização do Estado e não tinha nenhum poder político, entretanto, as universidades eram sua saída. Elias percebe que uma intelligentsia é formada na Alemanha tendo como núcleo os escritores, artistas, filósofos, poetas e etc e etc que saíram das fileiras burguesas. A rejeição à aristocracia de corte começa a se firmar institucionalmente com a formação de um corpo de intelectuais que reforçavam todo o campo cultural e intelectual do país e a termo cultura se firma como um termo que valoriza aquilo que é único. O termo cobre as estruturas econômicas, políticas, as invenções, as tecnologias, mas está sempre em uma esfera intelectual, em um profundidade de conhecimento e em um princípio de distinção. A “cultura” é o termo que a classe burguesa alemã usa para legitimar sua diferença imiscível com a aristocracia. É um termo de autoafirmação. Enquanto civilizado era o sujeito superficial, burro, mas controlado, culto era o sujeito do conhecimento, o detentor do saber.

Por sua vez, civilização tem um processo longo dentro das classes dominantes francesas. A mudança do termo é demarcada por Elias em transformações históricas que podem ser vistas nas passagens dos termos distintivos das classes dominantes de cortês, polido até civilizado. Estas transformações são demarcadas por novos padrões de refinamento e controle dos instintos. Não preciso dizer que Elias observa esta transformação como algo mais ou menos homogêneo por toda a Europa. Não necessariamente em todas as cortes, mas, pelo menos, no ideal que estas cortes trazem para o que deveria se tornar uma sociedade de corte.

Em um dado momento, um dado termo começa a ser espalhado para o restante da sociedade, após ser um símbolo de distinção das classes dominantes. Quando isso acontece, é hora de encontrar um novo símbolo de distinção. Para Elias, o fato dos comportamentos de consumo (como a etiqueta à mesa) ter sido notável se deve pela aristocracia de corte ser uma das classes dominantes mais ligadas ao consumo e menos ligada à produção. Com base nisso, como o processo civilizador teria como objeto os meios de produção? Isso só ocorreria com a tomada de poder plena da burguesia.

A aristocracia utiliza o termo de civilização exatamente para se afastar das classes dominadas, para se diferenciar destas classes. O termo não é neutro, mas exibe um passo além dentro do “caminho”, ou da história, da humanidade.

O processo

O interessante no estudo de Elias é que, tomando como objeto os variados tipos de comportamentos das sociedades de corte, tomando como objeto de análise os livros e manuais de comportamentos, de bons modos, ele percebe que, de um perspectiva histórica, de um ponto de vista a longo prazo, há um movimento de controle cada vez maior dos instintos. Esse é o processo civilizador. Um processo onde as estruturas emocionais incorporam controles instituais cada vez maiores e se modificam de acordo com as transformações que acontecem na própria sociedade.

É uma análise sociogenética e psicogenética daquilo que ele chama de processo civilizador, o processo de afastamento cada vez maior da “naturalidade”, ou, uma caminhada ao controle dos impulsos infindável.

Neste processo, por exemplo, Elias localiza historicamente a estrutura psicológica descrita por Freud. Ego, Id e Superego fazem parte de uma estrutura que só poderia realmente ter nascido em tempo de alto controle e repressão. Esta é uma interpretação da estrutura psíquica que faz sentido e que explica os indivíduos da sociedade por ser uma estrutura que tem lugar cativo para as contradições cada vez maiores de impulso, de gozo e de refinamento, de repressão, de controle.

A estrutura social e a estrutura de personalidade, ou estrutura psíquica, são resultados de uma inter-relação interminável entre elas próprias. Elias demonstra como determinadas práticas comuns em um dado momento da história se transformavam em práticas horrendas em outro e em práticas indescritíveis em nossa época.

Em exemplo curioso são as chamadas “funções corporais”. Uma das regras em um livro de etiqueta era “falar com alguém que está defecando é sinal de falta de educação. Ande pela pessoa como se ela não estivesse no local”. Entenda, se há uma regra para isso, então é muito lógico de que essa não era uma prática incomum. Entretanto, em nossa sociedade moderna [ou pós-moderna] nem mesmo se fala sobre este tipo de coisa.


Em relação às crianças, à sua educação, temos uma surpresa enorme em perceber que os hábitos das crianças foram se tornando mais rígidos com o aumento das demandas por controle e, em dados momentos, regras escritas para adultos já estavam tão enraizadas nos hábitos diários que eram somente escritas e impostas às crianças. A criança precisava incorporar um processo civilizador de séculos em somente alguns anos. Um processo que custou milhares de transformações precisava ser absorvido em um curto período de tempo. Isso não significa que crianças de outras épocas não precisavam incorporar nenhuma regra, mas o aumento das exigências de controle e repressão foi tão acentuado no período estudado que este acúmulo de regras já podia ser visto nas diferenças no tratamento das crianças, agora submetidas a regras que antes não eram nem imaginadas. Ao mesmo tempo, adultos já não “precisavam” destas regras. Já eram “naturais”.

Isso deixa também claro que as explicações médicas, racionalizadas e ultracientíficas sobre nossos atuais hábitos não são explicações irredutíveis. São, na verdade, explicações que acontecem depois da escolha dos hábitos vigentes, ou melhor, são explicações localizadas historicamente que legitimam um dado hábito completamente arbitrário. Um hábito que estabelece relações de dominação e hierarquiza a sociedade.


fonte: colunas tortas

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

1984


DO QUE TRATA?

Metáfora pessimista do futuro da humanidade dominada pelos regimes totalitários, o livro se passa no então remoto ano de 1984, quando o Estado domina a vida dos cidadãos. Winston é um funcionário que se revolta contra o regime, movido pelo amor a uma colega. Mas é preso e torturado e acaba desenvolvendo devoção cega ao governo.

QUEM ESCREVEU?

Nascido na Índia, então colônia da Inglaterra, George Orwell (1903-1950) se chamava Eric Arthur Blair. Foi voluntário na luta contra Franco na Espanha e um dos primeiros ocidentais simpatizantes da esquerda a se dar conta dos caminhos tomados pelo stalinismo, por isso dedicando seus últimos anos a denunciá-lo. Morreu pouco depois de ter seu romance publicado, tuberculoso e pobre.

POR QUE MUDOU A HUMANIDADE?

Denunciou o perigo das sociedades totalitárias, como a antiga União Soviética, e do crescente domínio dos governos na vida privada dos cidadãos, além de antever o poder da mídia no controle político do povo. Está no livro a famosa figura do Big Brother, o Grande Irmão onipresente, que tudo vê, tudo sabe, tudo conhece.



fonte: super abril

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Maquiavel | O príncipe em PDF para download


O florentino Nicolau Maquiavel (1469-1527) foi o secretário da República de Florença entre 1498 e 1512 e desempenhou diversas missões diplomáticas em diferentes cortes italianas e européias. Em 1512, foi encarcerado pelos Médici. Considerado um dos “criadores” da ciência política,  em O Príncipe (1513), Maquiavel discute a essência do poder político, sustentando que a sociedade não pode existir sem ordem – algo que o príncipe deve garantir mediante sua ação política…
(CONFIRA UM PAPO SOBRE O PENSAMENTO DE MAQUIAVEL - CLICANDO AQUI)

Distancio-me (…) dos métodos seguidos pelos demais e, sendo meu propósito escrever algo útil para quem ler, pareceu-me mais conveniente ir diretamente para a verdade da coisa do que para a representação imaginaria dela. Muitos imaginaram repúblicas e principados que jamais ninguém viu ou soube da existência. Porque há tanta distância entre como se vive e como se deveria viver, aquele que deixa de lado o que faz por aquilo que deveria fazer aprende antes sua ruína do que sua preservação. Porque um homem que queira ser sempre bom em todos os pontos, entre tantos que não o são, tecerá, necessariamente, sua ruína. Por tudo isso, é necessário, para um príncipe manter-se, que ele aprenda a poder ser mau e a usar ou não essa capacidade em função da necessidade.
Para fazer o download do livro – CLIQUE AQUI


fonte: farofa filosófica

domingo, 15 de outubro de 2017

Teoria Social em Anthony Giddens


Para Giddens  o indivíduo é um agente reflexivo. A reflexividade implica um posicionamento de cada um e uma co-presença. A sociedade é um conjunto de interesses entre cruzados. Um sistemas sociais é estendido como uma configuração sobre (lapsos) de tempo-espaço.

Giddens propõe observar com maior detalhe o conceito de Sociedade, considerado por muitos como a principal unidade de análise nas ciências sociais.

Revisão do conceito de Sociedade

Giddens rejeita o ponto de vista da sociologia estrutural, que considera o conceito de sociedade ligado de modo direto ao de coerção.

Segundo ele, as propriedades estruturais dos sistemas sociais seriam simultaneamente facilitadoras e coercivas. (Confira um papo sobre "Amor Líquido" - CLICANDO AQUI

Sociedades, sistemas sociais

O autor traz à tona dois sentidos atribuídos à sociedade no uso comum:

Sociedade enquanto conotação generalizada de interação ou associação social.
Sociedade enquanto uma unidade, com fronteiras que distinguem de outras.
Para Giddens, as totalidades sociais nem sempre possuem fronteiras claramente demarcadas, embora estejam tipicamente associadas a formas definidas de local. A resistência a esses pressupostos pode ser facilitada se reconhecermos que as totalidades sociais são encontradas dentro do contexto de sistemas intersociais distribuídos ao longo do tempo-espaço.

Para Giddens, todas as sociedades seriam sistemas sociais e, ao mesmo tempo, constituídas pela interseção de múltiplos sistemas sociais. Estes podem ser totalmente ‘internos’ às sociedades ou transpor as linhas divisórias entre o ‘interior’ e o ‘exterior’, formando uma diversidade de possíveis modos de conexão entre totalidades sociais e sistemas intersociais.

As sociedades, então, são sistemas sociais constituídos por uma série de outras relações sistêmicas, nas quais estão inseridas. Logo, a primeira e mais básica característica de uma sociedade seria um “aglomerado de instituições” global especificável através do tempo e do espaço. Outras características são:

Uma associação entre o sistema social e um local ou território específico. Os locais ocupados por uma sociedade não são necessariamente áreas fixas. As sociedades nômades erram em percursos tempo-espaço de tipos variáveis.
A existência de elementos normativos que envolvem a pretensão de legítima ocupação do local. Os modos e estilos de tais pretensões de legitimidade podem, é claro, ser de muitos tipos e ser contestados em maior ou menor grau.
A preponderância, entre os membros da sociedade, de sentimentos de que possuam alguma identidade comum, como quer que esta se expresse ou se revele. Esses sentimentos podem ser manifestos tanto na consciência prática quanto na consciência discursiva e não pressupõem um “consenso de valor”. Os indivíduos podem estar cônscios de pertencer a uma coletividade determinada sem concordar em que isso seja necessariamente correto e apropriado.
Giddens traz exemplos como o caso da China que, em determinados períodos de sua história, colocou diversos grupos etnicamente distintos no sul do país como parte de uma ‘sociedade chinesa’.

A regionalização de amplo espectro não deveria ser tratada como simplesmente composta de relações agregadas entre “sociedades”. Esse ponto de vista possui alguma validade quando aplicado ao mundo moderno de nações-Estados internamente centralizados, mas não quando se fala de eras anteriores.

Estrutura e coerção: Durkheim e outros

Neste tópico, Giddens realiza críticas à grande parte da sociologia estrutural, de Durkheim em diante, que se inspiraram na ideia de que as propriedades estruturais da sociedade formam influências coercivas sobre a ação.

A teoria da estruturação contrasta com essa concepção, pois se baseia na proposição de que a estrutura é sempre tanto facilitadora quanto coerciva, em virtude da relação inerente entre estrutura e agência.

Giddens argumenta que a teoria da estruturação não minimiza, de maneira nenhuma, a importância dos aspectos coercivos da estrutura. Contudo, a ‘coerção’ não pode ser considerada a única qualidade definidora de uma ‘estrutura’. Na teoria da estruturação, a ‘estrutura’ foi concebida como uma propriedade dos sistemas sociais, ‘contida’ em práticas reproduzidas e inseridas no tempo e no espaço. Os sistemas sociais, por sua vez, estão organizados hierárquica e lateralmente dentro de totalidades sociais, cujas instituições formam ‘conjuntos articulados’.

Ainda sobre a crítica à visão da sociologia estrutural, Giddens mostra como Durkheim associa coerção através da observação de que a Longue durée de instituições tanto precede quanto ultrapassa as vidas dos indivíduos nascidos em uma determinada sociedade. Em seus primeiros escritos, Durkheim enfatizou os elementos coercivos da socialização, mas, depois, ele passou a perceber com clareza cada vez maior que a socialização funde a coerção com a facilitação.

Isso é demonstrado no caso da aprendizagem da primeira língua. Ninguém “escolhe” a sua língua pátria, embora aprender a fala-la envolva elementos definitivos de submissão. Como qualquer língua cerceia o pensamento (e a ação) no sentido de que pressupõe uma série de propriedades articuladas e governadas por regras, o processo de aprendizagem linguística fixa limites à cognição e à atividade. Mas, na mesma ordem de ideias, a aprendizagem de uma língua expande imensamente as capacidades cognitivas e práticas do indivíduo.

Com isso, Giddens aponta que as totalidades sociais não só preexistem e sobrevivem aos indivíduos, mas também se expandem no tempo-espaço. Nesse sentido, propriedades estruturais dos sistemas sociais são certamente exteriores às atividades do indivíduo.

As sociedades humanas, ou sistemas sociais, não existiriam, em absoluto, sem a agência humana. Mas não se trata de que os agentes, ou autores, criam sistemas sociais. Eles os reproduzem ou transformam, refazendo o que já está feito na continuidade da práxis.

Quanto mais as instituições se fixam com firmeza no tempo e espaço, mais elas resistem à manipulação ou mudanças realizadas pelo agente individual. Esse significado de coerção também está acoplado à facilitação. O distanciamento tempo-espaço fecha algumas possibilidades de experiência humana ao mesmo tempo em que abre outras.

Com isso, o âmbito de ação do indivíduo não é definido apenas externamente. Quando Durkheim liga externalidade e coerção, reforça uma concepção naturalista da ciência social – ou seja, quis buscar apoio para a ideia de que existem aspectos discerníveis da vida social governados por forças análogas às que operam no mundo material.

Giddens fecha o tópico apontando que as coerções são de importância essencial para a teoria da estruturação. Capacidade e restrições de acoplamento, dentro de cenários materiais definidos, criando possíveis formas de atividade para os seres humanos. Contudo, esse fenômeno também possui características facilitadoras de ação. Giddens fala que a tendência desses autores (sociologia estrutural) foi enxergar na coerção uma fonte causação, mais ou menos equivalente a operação de forças causais impessoais na natureza. Ou seja, o raio de “ação livre” dos agentes é restringido por forças externas que fixam limites. Ou seja, a coerção estrutural está ligada a um modelo de ciência natural (Causal).

Três sentidos de “coerção”

Neste tópico, Giddens considera o significado de coerção com respeito à coerção material e à associada a sanções, depois à estrutural.

– Coerção física, limitando as vidas sociais viáveis que as pessoas podem levar; Todo ser humano tem que defrontar com as coerções do corpo, seus meios de mobilidade e comunicação.
– Aspectos coercivos do poder são experimentados como sansões de vários tipos, indo desde a aplicação de força ou da violência ou a ameaça disso, até a expressão moderada de desaprovação.
– A coerção estrutural é descrita como a fixação de limites à gama de opções que um ator, ou pluralidade de aotes, tem acesso numa dada circunstância ou tipo de circunstância.
Coerção e reificação

A ‘reificação’ tem sido entendida de formas muito diversas na literatura da teoria social. Entre esses usos divergentes, três sentidos característicos podem ser mais comumente discernidos.

Um deles é um sentido animista, em que as relações sociais são atribuídas a características personificadas. (Exemplo do fetichismo da mercadoria – as produções humanas se apresentam como seres independentes dotados de vida e estabelecem relações com a raça humana).
Outro sentido no qual o termo reificação é empregado, refere-se as circunstâncias em que os fenômenos sociais tornam-se dotados de propriedades características de coisas, que eles, de fato, não possuem,
Finalmente o termo ‘reificação’ é usado, por vezes, para designar características das teorias sociais que tratamos conceitos como se fossem objetos a que se referiram, ao atribuir propriedades a esses conceitos.
O “modo reificado” deve ser considerado uma forma ou estilo de discurso, no qual as propriedades dos sistemas sociais são vistas como tendo a mesma fixidez pressupostas nas leis da natureza.

O conceito de princípios estruturais

Giddens inicia o tópico fazendo um apanhado do que foi abordado no capítulo. Segundo o autor:

A Coerção estrutural não se expressa em termos das implacáveis formas causais que os sociólogos estruturais têm em mente quando tanto enfatizam a associação de ‘estrutura’ com ‘coerção’.
As coerções estruturais não operam independentemente dos motivos e razões dos agentes para o que fazem. Não podem ser comparadas com o efeito de, por exemplo, um terremoto que destrói uma cidade e seus habitantes sem que eles possam fazer nada.
Os únicos objetos moventes em relações sociais humanas são os agentes individuais, que empregam recursos para fazer as coisas acontecerem intencionalmente ou não.
As propriedades estruturais de sistemas sociais não atuam ou “agem sobre” alguém como as forças da natureza, para “compelir” o indivíduo a se comportar de um modo particular.
Entretanto, existe uma serie de noções adicionais pertinentes à questão da “estrutura” em análise social, e elas requerem especial consideração. Examiná-las-ei abordando pela ordem as seguintes questões: como deve ser desenvolvido o conceito de “principio estrutural”? Que níveis de abstração podem ser distinguidos no estudo das propriedades estruturais de sistemas sociais? De que modo os diversos sistemas sociais se articulam dentro de totalidades sociais?

Estruturas, propriedades estruturais

O conceito de estrutura pode ser usado de um modo técnico e de um modo mais geral. Entendida como regras e recursos, a estrutura esta repetidamente subentendida na reprodução de sistemas sociais e é totalmente fundamental para a teoria da estruturação. Se usada de um modo mais impreciso, pode-se falar dela em referência as características institucionalizadas (propriedades estruturais) das sociedades. Em ambos os usos, “estrutura” é uma categoria genérica envolvida em cada um dos conceitos estruturais abaixo indicados:

1. principias estruturais: princípios de organização de totalidades sociais;

2. estruturas: conjuntos de regras e recursos envolvidos na articulação de sistemas sociais;

3. propriedades estruturais: características institucionalizadas dos sistemas sociais, estendendo-se ao longo do tempo/espaço.

A identificação de princípios estruturais, e suas conjunturas em sistemas intersociais, representa o nível mais abrangente de análise institucional. Quer dizer, análise desses princípios se refere a modos de diferenciação e articulação de instituições através do tempo-espaço de maior “profundidade”.

Giddens fecha o tópico discorrendo como o estudo de conjuntos estruturais, ou estruturas, envolve o isolamento de distintos “grupos” de relações de transformação/mediação implícitos na designação de princípios estruturais. Os conjuntos estruturais são formados pela mútua conversibilidade das regras e dos recursos envolvidos na reprodução social. As estruturas podem ser analiticamente distinguidas, segundo o autor, dentro de cada uma das três dimensões de estruturação, significação, legitimação e dominação, ou através de todas estas.

fonte: global heritages

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

Elogio da Loucura em PDF para download


O ensaio, publicado em 1511 por Erasmo de Roterdã (1466-1536), é repleto de alusões clássicas, escritas no estilo típico dos humanistas do Renascimento. A Loucura se compara aos deuses, filha de Plutão e Frescura, educada pela Inebriação e Ignorância, cujos companheiros fiéis incluem Philautia (amor-próprio), Kolakia (elogios), Lethe (esquecimento), Misoponia (preguiça), Hedone (prazer), Anoia (Loucura), Tryphe (falta de vontade), Komos (destempero) e Eegretos Hypnos (sono morto).
(Para saber mais sobre a filosofia do renascimento - CLIQUE AQUI)

O Elogio da Loucura conheceu um enorme êxito popular, para surpresa de Erasmo e, também, para seu desgosto. O Papa Leão X achou a obra divertida. Antes da morte de Erasmo já havia sido traduzida para o francês e alemão. Uma edição de 1511 foi ilustrada com gravuras em madeira de Hans Holbein, que se tornaram as ilustrações da obra mais difundidas. A obra influenciou a essência da retórica durante o século XVI, se transformando em um exercício popular entre os estudantes da época.

Para fazer o download do livro - CLIQUE AQUI

terça-feira, 10 de outubro de 2017

Werther e o Suicídio


DO QUE TRATA?

Romance epistolar em que o jovem Werther conta ao amigo Wilhelm a história de seu amor impossível pela bela Charlotte, prometida em casamento para outro. De temperamento sensível e artístico, ele não consegue esquecê-la e no final acaba se suicidando com um tiro de pistola na cabeça. Quando lançado na Europa, o livro inspirou uma leva de jovens leitores, que passaram a se vestir como o protagonista. Atribui-se a ele uma onda de suicídios na época. Dizem que a história surgiu a partir de uma paixão não correspondida de Goethe, que afirmou ter matado Werther para poder sobreviver. (Confira um papo sobre Durkheim e o Suicídio - CLICANDO AQUI)

QUEM ESCREVEU?

Goethe (1749-1832) é um dos maiores nomes da literatura alemã. Formou-se em Direito e ocupou vários cargos políticos. Tinha muito interesse por alquimia e ciência e fez descobertas pesquisando plantas e animais. Sua “teoria das cores” influenciou os pintores Kandisnky e Mondrian. Participou das guerras napoleônicas, combatendo a França. Autor também de Fausto, conviveu com grandes artistas da cultura alemã, entre eles Hegel e Schiller.

POR QUE MUDOU A HUMANIDADE?

O livro inaugura o romantismo. Mais do que o trágico e impactante final, a grande ruptura realizada por Goethe no livro foi a expressão do desejo pelo impossível, um dos conceitos-chave para se entender as bases do pensamento romântico.

MORREU POR AMOR

Como foi o suicídio de Werther?

“Pela manhã, às 6 horas, o criado entrou no quarto com a luz. Encontrou o seu senhor no chão, viu a pistola e o sangue. Chamou-o, mexeu nele; nenhuma resposta, ele ainda agonizava. Correu em busca dos médicos e de Albert. Lotte ouviu alguém tocar a campanhia e um tremor convulsionou-lhe todos os membros (…). Tinha atirado na cabeça, logo acima do olho direito, fazendo saltar os miolos. Pelo sangue espalhado no espaldar da cadeira, concluiu-se que ele realizara seu intento sentado à escrivaninha, caíra em seguida, rolando convulsivamente em volta da cadeira. Estava estendido de costas perto da janela, inerte, todo vestido e calçado, de casaca azul e colete amarelo. (…) Do vinho, bebera somente um copo.”

(Wilhelm, amigo de Werther, escreve após a morte do companheiro)

(Tradução de Erlon José Paschoal)


fonte: super abril

domingo, 8 de outubro de 2017

Franz Kafka

Franz Kafka nasceu em Praga a 3 de julho de 1883, cidade que durante todos os 40 anos da vida do escritor pertenceu à monarquia austro-húngara.

Filho de um abastado comerciante judeu, Kafka cresceu sob as influências de três culturas: a judia, a tcheca e a alemã.

Formado em direito, ele fez parte, junto com outros escritores da época, da chamada Escola de Praga. Esse movimento era basicamente uma maneira de criação artística alicerçada em uma grande atração pelo realismo, uma inclinação à metafísica e uma síntese entre uma racional lucidez e um forte traço irônico.

Esse híbrido de ironia e lucidez aparece na maioria dos textos de Kafka.

Suas obras também conseguem formalizar e abrigar leituras totalmente relacionadas com a condição do ser humano moderno.O olhar kafkiano é direcionado para coisas como a opressão burocrática das instituições, a "justiça" e a fragilidade do homem comum frente a problemas cotidianos.

O primeiro livro de Kafka foi "Consideração", publicado em 1913. 

No ano seguinte à publicação da sua primeira obra, Kafka sofreu uma grande crise emocional.

Alguns estudiosos afirmam que esta crise foi causada por motivo de seu noivado, outros defendem que o autor tcheco teria ficado emocionalmente abalado com início da 1ª Guerra Mundial ocorrido no mesmo ano. (Aproveite e confira um papo sobre Friedrich Nietzsche - CLICANDO AQUI)

As obras mais famosas de Kafka foram escritas entre 1913 e 1921, são elas: "A Metamorfose", "O Processo", "O Castelo", "O Foguista" (que é na verdade o primeiro capítulo de "América"), "A Sentença" e "O Artista da Fome".

Em 1920, Kafka abandonou seu emprego em uma companhia de seguros por razões de saúde. Havia contraído tuberculose. Nos anos 1920 e 1921, Kafka relacionou-se com a escritora tcheca Milena Jesenká-Pollak, mas seu grande amor foi por uma mulher que conheceria apenas no final de sua vida, Dora Dyamant. 


As histórias criadas por esse judeu tcheco que escrevia em alemão deram voz ao indivíduo que caminha nas ruas das grandes cidades contemporâneas. O personagem Gregor Samsa, de Metamorfose, é o homem tornado inseto frente à realidade urbana avassaladora, burocrática e tão cheia de gigantismos. Samsa reproduz a sensação do homem que virou o inseto insignificante das cidades modernas e que, quando em vez, morre aos milhões nos campos de guerra. Nenhum autor representou de forma tão contundente a modernidade. Segundo o crítico literário George Steiner, "o extremismo da posição literária de Kafka (...) torna a estrutura representativa e a centralidade de sua façanha mais notáveis. Nenhuma outra voz foi testemunha mais verdadeira da natureza de nossos tempos." 

Para ler Kafka são necessários alguns cuidados especiais, entre eles, contar com uma certa atenção à maneira com que toda obra se constrói, principalmente seus períodos; estar sempre consciente de que toda a criação literária de Kafka foi dolorida, feita com o intuito de não

parecer bonita, de ser, principalmente, uma obra baseada na dor; ficar atento a todos os detalhes do texto, pois em Kafka, até as imperfeições são propositais, ou seja, segundo Theodor Adorno, até "as deformações em Kafka são precisas".

Durante sua vida, Kafka nunca conseguiu atingir grande fama com seus livros, porém, algum tempo depois de sua morte, no dia 3 de junho de 1924, em um sanatório perto de Viena, onde internara-se por causa de sua tuberculose, sua obra literária atingiria enorme influência sobre as pessoas, passando a ser cultuada por leitores de quase todo o planeta.


fonte: folha online